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São Paulo: de ‘terra da garoa’ para cidade das tempestades erráticas

Urbanização sem planejamento e mudanças climáticas extremas fizeram o município perder o apelido





Foto: Paulo Pinto/Agência Brasil
Foto: Paulo Pinto/Agência Brasil

O apelido “terra da garoa” aparece em músicas de grandes artistas, como Tonico e Tinoco e Thaíde, e no vocabulário popular sempre que o objetivo é fazer referência à cidade de São Paulo. Mas, as chuvas dos primeiros meses de 2025, demonstram que o clima, há décadas, dá sinas de transformação e o que temos são tempestades erráticas: chuvas que ocorrem de forma imprevisível ou irregular, sem um padrão fixo, ou que mudam de direção e intensidade de maneira inesperada.


A origem do apelido se deve ao clima nublado, com chuvas finas e constantes, que era comum na região, causando uma sensação quase permanente de umidade no ar da cidade.


Antes de ser conhecido assim, São Paulo tinha outro nome: Planalto de Piratininga. Nesse tempo, o clima já era descrito por portugueses, destacando as chuvas que ocorriam dia sim e dia não, o ano inteiro, uma característica da Floresta Atlântica.


Carlos Bocuhy, presidente do Instituto Brasileiro de Proteção Ambiental (Proam) explica que a brisa marítima avançava, carregada de umidade, em direção ao continente pela Serra do Mar, causando neblina e garoa, mas devido à perda de vegetação e impermeabilização do solo, desde os anos 70, é possível perceber que a neblina está recuando. “A garoa cedeu lugar às tempestades erráticas.”


Com a urbanização e especulação imobiliária o solo foi coberto com materiais como concreto, asfalto e outros revestimentos, gerando duas consequências graves ao clima, as “ilhas de calor” e o de impermeabilização do solo.


“São Paulo possuía centenas de campos de futebol de várzea há cem anos. Hoje, quase não existem mais. As áreas de cheias dos rios Tietê, Tamanduateí e Pinheiros foram densamente ocupadas. Isso altera o clima gerando condições nocivas à saúde pública", afirma o estudioso.


Entenda as consequências no clima


As ilhas de calor são formadas quando o concreto e o asfalto absorvem e retêm mais calor durante o dia. À noite, esses materiais liberam esse calor acumulado, mantendo temperatura elevada nessas áreas.


Já a impermeabilização do solo impede a absorção da chuva e as águas correm superficialmente provocando alagamentos e inundações, o que pode reduzir a umidade no ambiente e alterar drasticamente o clima da região.


"Se a gente não tiver um olhar diferenciado, e questionar essa questão de consumo desenfreado que o capitalismo prega, nós das grandes cidades, realmente, sofreremos muito, então a gente precisa pensar numa mudança efetiva da nossa sociedade.", diz Marta Angela Marcondes bióloga e coordenadora do curso de gestão ambiental da USCS (Universidade Municipal de São Caetano do Sul) em entrevista à Agência Ethos.


Bocuhy ressalta ainda o impacto da atividade industrial. Para ele, a expansão de grandes centros logísticos no entorno da cidade, levaram a induzir o aumento da ocupação urbana, gerando ainda mais consequências para a população das várzeas e periferias. O especialista sugere que isso contribuiu para a perda de regularidade climática, decorrente do aquecimento global, provocando um desajuste com mudanças rápidas de ar, resultando em extremos de clima seco, calor intenso e chuvas muito concentradas.


Marta, destaca ainda que o Brasil inteiro sofre as consequências da urbanização sem planejamento, não apenas SP. De acordo com ela, o desmatamento e o lançamento de gases de efeito estufa na atmosfera, como CO₂ e Metano — muitas vezes gerado pelo setor agropecuário — contribuem para o cenário nacionalmente.


“A industrialização acelerou os processos das mudanças climáticas de forma assustadora, e claro, o consumo de bens com o avanço do capitalismo. Na realidade são vários fatores que contribuem direta e indiretamente para que as mudanças climáticas sejam extremas e inevitáveis. Entre eles, a mineração, a industrialização, a urbanização, a agricultura e a total desinformação para todos esses fatores. Contribuindo para que eleitores continuem elegendo políticos que estão totalmente desalinhados com os processos de preservação e recuperação ambiental", completa Marta.


De acordo com os especialistas, o caminho para a solução é tentar recuperar a vegetação das cidades. Eles também indicam medidas alcançáveis para a população lidar com as mudanças climáticas extremas, como telhados verdes, construir paredes que sejam menos sujeitas ao aquecimento, utilizar material construtivo menos impactante, manter a cidade limpa evitando o entupimento de bueiros, diminuir o consumo desnecessário, não desperdiçar água e energia.

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